
O objetivo de programas é aumentar o bem-estar
e a segurança no ambiente de trabalho, reduzir sua freqüência e a severidade de
suas conseqüências. Para tanto , uma das condições é a eliminação de situações
percebidas como de risco nos locais de trabalho. Tal percepção é construída por
fatores objetivos, tais como;
■ condições materiais e experiência de
operadores; e
■ subjetivos, tais como a confiabilidade das
decisões de operadores, o que remete ao estudo das falhas humanas em situações
intrinsecamente seguras, ou seja, ao estudo da confiabilidade humana.
FALHAS HUMANAS
■Falhas humanas podem ser ativas ou latentes,
voluntárias ou involuntárias.
■Falhas ativas ocorrem no contexto do acidente
- são as causas imediatas que determinaram a ocorrência: atos inseguros ou erros
na operação de equipamentos ou dispositivos de segurança.
■Falhas latentes são anteriores ao acidente -
atos que criaram condições para a ocorrência, tais como decisões erradas ou
modelo incompleto de gestão da atividade.
■Falhas voluntárias são burlas intencionais de
procedimentos.
■E falhas involuntárias são induzidas por
outras falhas, tais como instrumentação descalibrada ou eventos perturbadores
imprevistos.
Muitas vezes, falhas humanas envolvem
funcionários habilidosos, produtivos e bem-intencionados: incapacidade não
explica todas as anormalidades.
HOMEM-MÁQUINA
Integrar homem e tecnologia pode ajudar a
promover a segurança em atividades industriais. Para tanto, é preciso entender
como ocorre a interação homem-máquina e como a variabilidade nas situações
operacionais contribui para que falhas ocorram.
Em projetos de sistemas do tipo homem-máquina,
como em salas de controle, a presença do operador deve ser considerada desde o
início do projeto, reduzindo problemas de integração.
Salas de controle de plantas industriais
integram sistemas e equipamentos, onde os operadores monitoram, controlam e
intervêm no processo por interfaces gráficas e estações de trabalho. A interface
integra informações, dados, controles e comandos em telas, condiciona as
estratégias de realização da tarefa e é influente na segurança operacional, pois
afeta o modo como operadores recebem informações e modificam parâmetros da
operação. É pela interface que o operador faz contato perceptivo e cognitivo com
a planta.
Projeto e manutenção das instalações de um
sistema interativo homem-máquina podem ser baseados em abordagem centrada na
tecnologia ou no usuário.
No primeiro caso, as decisões de projeto
favorecem o uso e maximizam o desempenho da tecnologia.
No segundo, os requisitos de usuários devem
prevalecer nas decisões sobre a interface, e esta deve ser atendida pelos demais
elementos do sistema. A participação dos usuários nas decisões sobre o sistema
pode e deve ser estimulada ao longo de todo o ciclo de vida do sistema, pois as
características das interações podem se modificar ao longo do tempo. A aplicação
do método descrito neste artigo produziu ações que podem motivar decisões de
mudança no projeto original, sendo um exemplo de como conduzir a participação de
operadores usuários na concepção e modificação de um sistema interativo
homem-máquina, tal como em instalações petroquímicas.
Nessas instalações, uma situação de emergência,
tal como ruptura de tubulação ou vazamento, pode causar impactos econômicos,
sociais e ambientais à empresa, à sociedade e às comunidades vizinhas.
Vale a noção proposta por Reason de acidente
organizacional, que transcende o acidente individual: um evento frequentemente
catastrófico que envolve tecnologia complexa, tal como em plantas nucleares,
aviação ou petroquímica.
Também vale a noção de Perrow de acidente
sistêmico, mais presente em sistemas sociotécnicos, cuja origem é a
interdependência e a interação entre subsistemas de um sistema produtivo
complexo. Dificilmente identifica-se uma e apenas uma causa-raiz, cuja
erradicação elimina completamente a chance de acidente.
O risco surge como propriedade emergente em
sistemas produtivos complexos baseados na interação homem-máquina.
ERRO HUMANO E COGNIÇÃO
Falhas em sistemas produtivos podem ser
causadas por falhas em componentes físicos ou lógicos do sistema. Elas podem
conduzir a erro, que eventualmente se transforma em problema ou disfunção, em
encadeamento de eventos como na figura.
Um tipo de erro que pode ocasionar disfunção em
sistemas produtivos é o erro humano. Embora o comportamento humano em ambiente
complexo seja de difícil predição e tipificação, vários autores já propuseram
definições e tipificações para o comportamento humano em situação de erro.
■ Para Hollnagel, erro humano ocorre quando uma
ação falha ao produzir um resultado esperado ou produz consequências não
desejadas.
■ Para Sanders e Moray, erro humano é uma
decisão ou comportamento que reduz ou tem potencial para reduzir a segurança ou
o desempenho de um sistema.
■ Para Reason, há erro humano quando uma
sequência planejada de atividades falha na obtenção de um resultado e a falha
não pode ser atribuída a agentes externos.
■Para Rasmussen, se o desempenho de um sistema
foi insatisfatório devido a um ato humano, esse é um erro humano.
■Para Kantowitz e Sorkin, erro humano é uma
ação que viola limites de tolerância de um sistema.
■Para Reason, erros humanos são ações ou
omissões que resultam em desvios de parâmetros e colocam pessoas, equipamentos e
ambiente em risco.
Uma compreensiva tipologia do erro humano é
encontrada em Sharit e Reason, que mencionam: deslize, lapso e engano.
■Deslizes produzem comportamentos observáveis:
um operador aciona a chave errada.
■ Lapsos são erros sem comportamentos
observáveis: um operador esquece de acionar uma chave.
■ Enganos ocorrem quando há diferença entre
intenção e consequência de uma tarefa: um plano mal formulado é executado sem
erros. Enganos podem envolver erros de julgamento, de inferência na seleção de
objetivos ou na especificação dos meios para atingi-los.
Enganos podem ser por:
■omissão, quando um passo do plano não ocorre;
■seleção indesejada, quando um objeto foi mal
selecionado;
■repetição, quando um passo é repetido; ou
■ inversão sequencial, quando um passo ocorre
fora da sequência.
Enganos podem ocorrer:
■ no nível de regras, quando há falha na regra
de solução do problema, foi aplicada regra errada ou mal aplicada a regra certa;
e
■ no nível de conhecimento, quando surgem
problemas sem regras, que serão construídas partindo de saberes prévios. Em
situações de erro, operadores podem se adaptar e ser capazes de interpretar
novas situações e criar definições locais para aspectos implícitos nos
procedimentos
Condições para a ocorrência do erro
surgem:
■ quando, ao se projetar o sistema, vários
fatores podem não ter sido considerados, como, por exemplo, a cultura do
trabalhador e as condições do ambiente de trabalho.
■ o erro humano também decorre da interação
entre fatores situacionais do contexto e fatores relacionados ao indivíduo, que
agem quando este tenta regular as variações do sistema e produz a variabilidade
presente nos fatores subjetivos de percepção de risco.
Kantowitz e Sorkin classificaram os principais
fatores que explicam o desempenho humano e as possibilidades de erros em
sistemas produtivos complexos com interação homem-máquina:
■ fatores operacionais, tais como fadiga,
duração e complexidade da tarefa;
■ fatores situacionais, tal como layout da sala
e dos painéis;
■fatores ocupacionais, tais como atividades
múltiplas e simultâneas, carga de trabalho, tipo de supervisão;
■fatores pessoais, tais como capacitação e
experiência individual e de grupo, motivação, atitude, confiança, perda
sensorial, idade, peso, altura; e
■ fatores ambientais, tais como temperatura,
iluminação, espaço físico e ruído.
Um modo de entender o comportamento humano no
momento do erro é entender como alguns aspectos da cognição humana estão
estruturados. Para tal, lançam-se mão de modelos cognitivos que representem o
processamento de informações numa tomada de decisão ou no desempenho de uma
tarefa.
Na aprendizagem humana, ações inicialmente
conscientes tornam-se automáticas devido à repetição. A habilidade do operador
aumenta, e a tarefa passa a um nível de regulação cognitiva de menor esforço. Em
situações novas ou de incerteza, volta a regulação consciente.
A cognição humana pode ser:
■baseada na habilidade, quando requer destreza
sensório-motora na tarefa, acionada automaticamente por situações rotineiras
segundo um modelo mental adquirido;
■ baseada em regras, quando segue regras
construídas por aprendizagem e experiência (o sujeito interpreta a situação e
elege uma regra, no espaço de solução possível); e
■ baseada no conhecimento, quando surge uma
situação nova, sem regras válidas.
Comportamentos baseados em regras e em
conhecimento são processos conscientes: comportamento baseado na habilidade é
automático.

Outro modo de representar a cognição humana é
como faz Norman. Para o autor, no processo de cognição humana o comportamento
humano passa por sete fases de ação:
■formulação do objetivo;
■formulação da intenção;
■percepção do ambiente;
■interpretação do ambiente;
■definição da ação;
■execução da ação; e
■avaliação dos resultados.
Em ambos os casos, a realimentação joga
importante papel, interpretando e utilizando os resultados da atividade anterior
para influenciar as próximas atividades.
Confiabilidade humana
A confiabilidade humana teve impulso com o
acidente nuclear de Three Mile-Island. Reconheceu-se então que a ação humana,
condicionada pelo ambiente e por interações sistêmicas, pode levar sistemas
produtivos complexos a situações de risco.
Confiabilidade humana é a probabilidade que um
operador tenha sucesso em tarefa especificada, dentro de condições e de tempo
especificados, se este for limitante, sem outro resultado que degrade o sistema.
Uma tarefa bem-sucedida é aquela que alcançou a
meta, dentro das condições especificadas, sem criar perturbações.
Dada a relação com o contexto e interações
entre subsistemas, nem sempre dados de literatura podem ser transportados,
tornando importante o registro imediato das ocorrências. Informação atrasada ou
errada impõe perda de sincronia entre falha e correção. Além da probabilidade de
falhas, a confiabilidade humana inclui o estudo qualitativo dos fatores que
contribuem para a ocorrência da falha. Além de modelos de avaliação reativa da
confiabilidade humana, é necessário considerar modelos causais sociotécnicos
adaptativos, com ênfase em estratégias proativas de gerenciamento de
riscos.
Inserindo uma perspectiva qualitativa em
estudos de confiabilidade humana, Swain e Guttmann propuseram um método para
sistemas produtivos com interação homem-máquina, que consiste em:
■ descrever objetivos e funções do sistema,
características situacionais e características pessoais dos operadores;
■ descrever e analisar as tarefas para detectar
situações passíveis de erro;
■ estimar probabilidades para cada tipo de
erro;
■ determinar consequências dos erros e
probabilidades de se transformar em disfunções; e
■ propor modificações para aumentar a
confiabilidade do sistema.
Outro método é proposto por Filgueiras:
■ análise das tarefas humanas, compreendendo
também o contexto físico, psicológico e organizacional;
■análise do erro humano, identificando
situações de erro, consequências e possibilidade de recuperação;
■ quantificação dos erros, estimando a
probabilidade, a partir de dados históricos, e severidade de efeitos, por
julgamento de especialistas; e
■ propostas para evitar os erros mais
críticos.
PROCEDIMENTOS REDUZEM A PROBABILIDADE DE
ERRO
Um modo de aumentar a confiabilidade humana é o
uso de procedimentos formalizados. Um procedimento consiste em uma descrição
detalhada de como uma atividade deve ser realizada. Pode incluir fotografias e
desenhos que auxiliem o operador a entender a tarefa e facilitem o treinamento.
Também podem incorporar melhorias e correções que surgem durante a atividade,
tornando-se um documento dinâmico.
Muitas vezes, procedimentos incluem tempos
típicos para a atividade, que podem ser usados para verificar a adequação física
e psicológica do trabalhador à atividade. O não alcance desses tempos ou o
decaimento ao longo do turno podem indicar inadequação laboral à tarefa.
.
Procedimentos incluem condições de trabalho e
ações. Operadores atribuem-lhes valor baseado na frequência de sucesso. Quando
todas as condições previstas existem, ações bem-sucedidas aumentam a confiança
no procedimento. Sem condições perfeitas, operadores utilizam o procedimento
mais propenso ao sucesso na condição mais parecida.
Do ponto de vista cognitivo, a existência de
procedimentos reduz o nível de complexidade da operação, diminuindo a
probabilidade de erro humano, especialmente violação de rotina.
Fonte: Resumo - Análise qualitativa de aspectos
influentes em situações de risco observadas no gerador de vapor de uma planta
petroquímica, autores; Aline Fernanda de Oliveira, Miguel Afonso Sellitto
Nenhum comentário:
Postar um comentário